terça-feira, 4 de maio de 2010

Noite de terror na Delegacia: nas palavras de Isaías Moreira



Comarca de Taquara
2ª Vara
Rua Ernesto Alves, 1750 - CEP: 95600000 Fone: 51-3542-1933
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TERMO DE DEGRAVAÇÃO


Processo nº:
070/2.08.0000272-8
Natureza:
Crimes contra a Administração da Justiça
Autor:
Justiça Pública
Réu:
Isaías Moreira
Data da Audiência:
24/07/2008


2ª Vara Judicial
Espécie de Audiência: Interrogatório
Data: 24/07/08 às 15:00 horas
Processo: 070/2.08.0000272-8 Crimes Contra a Administração da Justiça
Autor: Justiça Pública
Réu: Isaías Moreira
Juíza de Direito: Angela Martini

Interrogando: Isaías Moreira, brasileiro, convivente, 38 anos, biscate. Residente no Morro da Pedra, Taquara. Lida na íntegra a denúncia. Cientificado de seus direitos constitucionais. Oportunizado entrevistar-se com Defensor, o que efetivamente ocorreu. Perguntado, respondeu:
Juíza: Lida a denúncia. O que tu tens a dizer com relação a essa acusação?
Interrogando: Isso é uma injustiça que estão fazendo. Porque na verdade eu não ia sair daqui pra fazer uma denúncia lá e mentir, porque a única coisa que eu não gosto é de entrar numa desse tipo assim, delegacia, nunca gostei, eu não ia sair daqui pra ir lá mentir. Eu fui falar a verdade.
Juíza: O Oziel e o L.A.M. são teus filhos?
Interrogando: São.
Juíza: Quando eles foram ouvidos na polícia, lá no processo quem envolve o Frederick e a Bárbara, tu estavas com eles?
Interrogando: Sim.
Juíza: O que tu viste durante a inquirição deles, eles foram bem tratados? Eles não foram?
Interrogando: No começo mais ou menos, daqui a pouco eles começaram a agitar muito os piás.
Juíza: Que tipo de agitação?
Interrogando: Agitação assim, chegar, falar com os piás ”responde rapaz”. E (...) daí os policial respondiam pra eles, eles faziam as perguntas pra eles, os piás diziam, perguntavam “o fulano abusou contigo”? Perguntavam pro L.A.M. “alguém mexeu no teu tico, fez isso, fez isso”. Não, nunca fez, e daí daqui a pouco eles davam virada nas costas, batiam na mesa, davam chute nas cadeiras. E daí um parava de fazer uma pergunta o outro vinha de novo, daqui a pouco o outro parava, o outro já fazia a mesma pergunta de novo, sempre daquele jeito, os piás ficaram apavorados. Daí quando eles começaram a passar o dedo no L.A.M. assim sabe, que ele tem uma queimadura assim.
Juíza: Passavam o dedo no queixo do L.A.M.?
Interrogando: Passava assim “levanta essa cabeça”. Pra cima, o meu guri bah, pequeno né.
Juíza: Pelo gesto que o Sr fez então eles empurravam o queixo do L.A.M.
Interrogando: Ele abaixava assim e eles pegavam assim, bah pela tudo assim se tu começar a mexer assim.
Juíza: O que ele tinha no queixo?
Interrogando: Ele queimou. Eles começavam a apavorar ele, “fala guri, vai falar que vocês vão apodrecer na cadeia, lá com o Fritz, primeiro nós vamos levar vocês lá pra Febem, daí dali vocês vão pra lá, e o teu irmão mais velho já ta guardadinha a cela pra ele”.
Juíza: E o Sr sabe o nome desses policiais que diziam isso?
Interrogando: É esse que ta no...
Juíza: Marcos e Sílvio?
Interrogando: Isto.
Juíza: Quanto tempo os meninos ficaram prestando depoimento?
Interrogando: Era duas e meia a hora que nós chegamos, saímos dali era nove e meia. Daí nós chegamos em casa às dez horas.
Juíza: Além do L.A.M. e do Oziel quem mais foi ouvido nesse dia?
Interrogando: O Ezequiel.
Juíza: Então ficaram das duas às nove ouvindo três pessoas?
Interrogando: Três pessoas. Até o meu mais velho não foi tanto, mas teve que ficar esperando pra... porque eles pegaram o meu mais velho primeiro.
Juíza: Como é o nome do mais velho?
Interrogando: Ezequiel. O Ezequiel é de maior, eles levaram pra outra sala lá, na primeira ali, daí prensaram de dois ali no canto, e daí enfiavam o braço nele ali pra ele falar, daí o piá dizendo que não, nunca fez nada.
Juíza: A sua esposa estava junto?
Interrogando: Não.
Juíza: Mais alguém presenciou esse fato Sr Isaías?
Interrogando: Estavam esses dois policiais e a mulher aquele que tava ali só, só nós três que tava.
Juíza: E aí quando é que o Sr decidiu que iria denunciar esse fato na corregedoria?
Interrogando: Eu saí dali, eles levaram nós até em casa.
Juíza: A polícia?
Interrogando: A polícia mesmo. Mas eu não podia nem sentar mais, fiquei apavorado, e eu sofro da coluna, não podia parar sentado em pé quase. Porque eu me apavorei, me atacou os nervos também, a gente naquele estado (...), daí eu fui e eles iam indo na estrada assim, sempre dizendo: “bah gurizada, vocês tão ferrados”.
Juíza: E quando é que o Sr resolveu que ia denunciá-los na corregedoria?
Interrogando: Daí eu fui pra casa, não dormi a noite toda, daí eu pensei, tem que ter lei, tem lei pra nós tem que ter lei pra eles também, daí eu pensei peguei e liguei pro meu irmão, esperei ele chegar da firma, liguei, “bah Zé, eu não entendo isso aí mas tu tem que se informar”. Daí levantei cedo “o que eu vou fazer”, eu fiquei agoniado, nem eu nunca dei um tapa na orelha do meu filho daquele jeito. Liguei pra ele de novo ele disse “não, me informei com fulano aí que tem lá em Porto Alegre a tal de diretoria lá, vai lá”. Eu disse como que eu vou ir cara, eu não tenho como. “Mas não tem ninguém que conhece Porto Alegre”? Eu pensei vou falar pro Cristiano, o Cristiano disse olha, eu tenho como levar, mas eu pego e peço pro meu primo levar nós então, mas tem que arrumar o dinheiro pra gasolina.
Juíza: Quem é o primo do Cristiano?
Interrogando: Ele mora lá em Parobé.
Juíza: Como é o nome dele?
Interrogando: O nome dele bem certo eu não sei mesmo.
Juíza: Mas o Cristiano não foi com vocês na Corregedoria?
Interrogando: Sim, foi, mas daí ele foi com o carro do (...).
Juíza: Do primo dele?
Interrogando: Do primo dele, porque ele não tem carro, não tinha.
Juíza: E que lhe atendeu lá na Corregedoria?
Interrogando: Ali foi uma mulher.
Juíza: E aí o Sr contou pra ela essa história que o Sr está me contando hoje?
Interrogando: Sim.
Juíza: E o que ela lhe disse?
Interrogando: Ela me explicou, “olha, que isso aí, não é bem fazer isso aí”. Mas eu disse não, eu vim aqui, to falando a verdade, eu não vim aqui pra mentir.
Juíza: Quando ela lhe disse “não é bom”, “não é bem fazer isso aí” ela estava se referindo a que?
Interrogando: Pensando que eu ia mentir de certo, chegar lá acusar um policial, daí ela achou assim meio ruim.
Juíza: E o Sr falou pra ela que os seus filhos poderiam depor?
Interrogando: Falei.
Juíza: O Sr conhece então esse dois policiais. O Sr tem alguma coisa contra eles?
Interrogando: Não, eu não tenho nada contra eles.
Juíza: O Delegado Juliano Ferreira o Sr conhece?
Interrogando: Eu só vi ele quando chegamos ali e depois desapareceu, não vi mais.
Juíza: Não tem nada contra ele?
Interrogando: Não tenho.
Juíza: Rosi Aparecida Rosa dos Santos o Sr conhece?
Interrogando: Não. Pode ser que eu conheço, mas assim não me lembro.
Juíza: E o Cristiano Fedrigo o Sr tem alguma coisa contra ele?
Interrogando: Não.
Juíza: O Sr quer dizer mais alguma coisa em sua defesa?
Interrogando: Quero sim, porque eu não posso mentir, tenho que contar a verdade, eu não Isa sair daqui de Taquara pra lá.
Juíza: O Dr Márcio vai fazer a sua defesa?
Interrogando: Sim.
Juíza: Pelo Ministério Público?
Ministério Público: O Sr permaneceu na sala onde foram tomados os depoimentos dos seus filhos durante todo o tempo?
Interrogando: Sim.
Ministério Público: O Sr já tinha recebido alguma noticia de que seus filhos teriam sido vítimas de abuso sexual antes?
Interrogando: Não.
Ministério Público: Ficou sabendo na Delegacia de Polícia?
Interrogando: Sim.
Ministério Público: Em Porto Alegre?
Interrogando: Aqui.
Ministério Público: Na Delegacia de Taquara?
Interrogando: De Taquara.
Ministério Público: Foram os policiais de Porto Alegre que vieram conversar com o Sr?
Interrogando: Sim.
Ministério Público: E o Sr não ficou surpreso, não ficou nervoso pelo fato de saber que seus filhos tinham sido vítimas de abuso sexual?
Interrogando: Fiquei mesmo.
Ministério Público: E o Sr não manifestou essa sua preocupação, não ficou nervoso para os policiais?
Interrogando: Não fiquei nervoso só porque eles falaram sobre meus filhos, uma coisa que não aconteceu, que os piás certo que confirmaram que nunca fez isto.
Ministério Público: Mas quando o Sr ficou sabendo disto que teria ocorrido pelos policiais o Sr não chorou, não ficou nervoso na Delegacia?
Interrogando: Fiquei nervoso mesmo, bah, Deus o livre.
Ministério Público: E o Sr não tentou averiguar porque que veio essa denúncia de abuso contra seus filhos? O Sr não se preocupou em sabe de onde surgiu essa denúncia de abuso e porque?
Interrogando: Sim, tentei mas, como é que a gente vai saber, de onde que saiu isso, só se ouvir da polícia ali que deu esse (...).
Ministério Público: Porque o Sr se preocupou tanto em buscar no Ministério Público aqui em Taquara, em procurar a corregedoria da polícia e não se preocupou em saber se efetivamente haviam ocorrido esses abusos?
Interrogando: Não sim, depois que aconteceu eu fui, fui ver, verificar e coisa, mas não.
Ministério Público: O que o Sr fez pra ver?
Interrogando: Eu andei perguntando pros outros guris também, pra ver né, pros outros vizinhos pra ver que foi intimado, fui atrás pra ver se era verdade, se aconteceu com eles também, disse não, nunca aconteceu nada então.
Ministério Público: Mas seus filhos freqüentavam a casa do Frederick?
Interrogando: Só pra fazer a limpeza, iam junto comigo ainda, quando eu trabalhava na colina.
Ministério Público: Freqüentavam o clube naturista?
Interrogando: Não. Eu trabalhava lá dentro, faz 16 meses que eu parei de trabalhar.
Ministério Público: O Oziel chegou a admitir para os policiais que teria sido abusado.
Interrogando: Não.
Ministério Público: Sim.
Interrogando: Não, isso não. Abusado?
Ministério Público: O Sr mesmo disse isso, que ele teria admitido e depois voltou atrás.
Interrogando: Não foi abusado, ele admitiu da hora que ele levou os tapas ali ele falou que o veio masturbava eles, isso aí.
Ministério Público: Que tapas que o Oziel levou?
Interrogando: Na cabeça e na orelha.
Ministério Público: Depois que o Oziel teria levado esses tapas ele admitiu ter sido abusado?
Interrogando: Aquela hora que ele falou sim, que o velho masturbava eles, o Oziel no caso, daí eles deram uma aliviada pro piá, e liberam nós, depois que o piá disse isso aí daí eles liberaram o piá.
Ministério Público: Sr Isaías porque o Sr procurou o Cristiano pra relatar esses fatos?
Interrogando: Porque é mais amigo, de vez em quando a gente ia jogar bola com eles, eu não jogava bola mas eu ia junto com eles no campo que eles iam todo sábado jogar bola.
Ministério Público: Mas o Cristiano não seria filho adotivo do Fritz?
Interrogando: Não.
Ministério Público: Qual é o vínculo do Cristiano com o Frederick?
Interrogando: A mãe dele que trabalha na casa do Frederick.
Ministério Público: Nada mais.
Juíza: Pela Defesa?
Defesa: Sr Isaías após o registro da ocorrência na corregedoria o Sr ou os seus filhos foram intimados a prestar declarações nessa investigação lá da Corregedoria de Porto Alegre?
Interrogando: Mais uma vez? Não nunca.
Defesa: Quando dessas agressões, essas ameaças o Sr referiu na delegacia de polícia qual foi a sua reação naquele momento Sr Isaías?
Interrogando: Aqui eu fiquei constrangido demais, eu fiquei apavorado.
Defesa: O Sr se sentiu ameaçado também pelos policiais?
Interrogando: Olha, a hora que o Oziel pediu pra ir tomar água e ir no banheiro porque na hora do tapa daí eu quis falar assim eles mandaram eu calar a boca.
Defesa: O Sr leu ou alguém leu pro Sr os depoimentos prestados pelos seus filhos e o seu próprio depoimento?
Interrogando: Não.
Defesa: O Sr sabe ler e escrever perfeitamente?
Interrogando: Nada, nada.
Defesa: Se em algum momento, antes ou depois dessa oportunidade aí que os seus filhos e o Sr prestaram depoimento na delegacia de polícia, se em algum momento seus filhos referiram ao Sr terem sofrido algum abuso sexual?
Interrogando: Não. Nunca.
Defesa: Nada mais.
Juíza: Nada mais.
(Gravação e transcrição realizada pela Estagiária Jaciane Fernandes dos Reis).
09 LAUDAS IMPRESSAS, DIA 25/07/08 ÀS 17h20min.
Legenda:
(...) = quando a fala é inaudível.
... = quando há pausa na fala, ou simplesmente nada é declarado.



Fonte:
http://www3.tjrs.jus.br/site_php/consulta/download/exibe_doc1g_oracle.php?id_comarca=taquara&ano_criacao=2008&cod_documento=58464&tem_campo_tipo_doc=S

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