quarta-feira, 20 de junho de 2012

O laudo que atrasou

O caso Colina do Sol está, legalmente, na fase dos argumentos finais. Na prática está, como está desde mais ou menos abril de 2008, na fase de postergação da verdade, durante qual a punição sem condenação dos acusados se estica.

Está na hora de rever a situação de todos os casos relacionados. Mas antes, para não cansar o leitores, vamos desvender o mistério laudo que apareceu no processo em 16 de abril deste ano. Infelizmente o "sigilo de Justiça" não permite conhecer o laudo na íntegra. O curto e grosso é: que ele não constata qualquer crime; ainda assim, é sobre objetos que não constam como apreendidos; e que supostamente está pendente desde janeiro de 2008.

Como apareceu o laudo?

O laudo misterioso apareceu no processo em 16 de abril. Quando Dr. Campana entregou seus argumentos finais no caso, o laudo estava aguardando no Fórum. Sem o laudo, o processo teria seguido para Dr. Márcio Flóriano Júnior, para que ele em 30 dias fizesse os argumentos finais em defesa dos três pais (agora somente de Marino, os outros dois se encontrando além da Justiça terreste), e depois para a juíza determinar a sentença.

Em vez disso, apareceu o laudo; o caso aguardou seis semanas na mesa da juíza e do juiz substituto para resolver o que fazer; foi para o Ministéiro Público; e depois de 10 dias voltou com uma "petição"; a juíza emitiu um "despacho; e um "mandado" ou foi emitido, ou devolvido. Aparece assim no site do TJ-RS, lembrando que eventos que acontecem no mesmo dia podem aparece fora de ordem:


 16/04/2012   JUNTADO OFÍCIO
   16/04/2012   JUNTADO LAUDO
   18/04/2012   DOCUMENTO(S) JUNTADO(S) - Laudo pericial
   18/04/2012   CONCLUSÃO AO JUIZ
   31/05/2012   CUMPRIR DESPACHO
   04/06/2012   DOCUMENTO(S) JUNTADO(S) - Petição
   04/06/2012   VISTA AO MP
   06/06/2012   CARGA MP
   18/06/2012   AUTOS RETORNADOS AO CARTÓRIO
   18/06/2012   DOCUMENTO(S) JUNTADO(S) - Mandado
   18/06/2012   CUMPRIR DESPACHO
   18/06/2012   JUNTADA PETIÇÃO
   18/06/2012   CONCLUSÃO AO JUIZ

O que poderia ser o laudo?

O aparecimento do laudo foi motivo de preocupação para quem acompanha o caso. O que poderia ser? Já listamos aqui todas as evidências físicas e os laudos periciais correspondentes.

O que faltava ser periciado era: os dois discos do computador de Dr. André; uma pericia brasileira de um dos discos rígidos externos (só há do FBI americano, que não tem validade legal); e uma perícia dos CDs que aparecerem em número além do que foi apreendido. Sendo que a polícia somente informou a Justiça do suposto computador de Dr. André oito meses depois do que foi alegadamente apreendido, o valor como prova seria bastante duvidoso.

Outra possibilidade era que vários dos laudos médicos não tinham validade, por ser estampados "PRELIMINAR" e faltar a assinatura do segundo perito, necessário na época que foram elaborados. Isso foi uma das "pegadinhas" que eu sabia, e segurei. Os laudos nem se foram corretamente assinados comprovariam que houve qualquer crime, muito menos apontariam os acusados como autores. Mas melhor que ficasse também sem valor formal, quer dizer, que fossem legalmente inválidos, não importando seu conteúdo. Será que a promotoria viu os argumentos finais de Dr. Edgar, e correu para juntar os laudos finais?

Nenhuma das opções anteriores

Enquanto o estimável Dr. Edgar utilizou uma manobra jurídica para liberar os outros laudos do "Segredo de Justiça", este laudo continua sob sigilo. Para evitar encrencas, vou dizer somente o que não está no laudo.

Estou informado de que o laudo misterioso não é de nenhuma das alternativas acima. É de ainda outras coisas (um HD de 10 GB, 102 CDs e 19 floppies)que não constam nos Autos de Apreensão. E, ainda, não traz nenhuma indício de qualquer crime.

Nem sustenta O Moleque®

Das supostas vítimas, O Moleque que Mente® é a única que alega que foi abusado pelos acusados. A palavra dele é confiável? Alega ainda que me viu na casa de Dr. André antes das prisões, que comprovamos falso, e de que fotos foram tirados dele na casa de Fritz e Barbara, fotos nunca encontradas.

Ainda que não tivesse provas de crime, se houver nestas coisas as fotos das quais falou, aumentaria a credibilidade d'O Moleque®. Não há.

Este novo laudo não fala de fotos de nenhum dos acusados, nem de qualquer das supostas vítimas, nem de fotos da casa de Fritz, nem de fotos de adultos com crianças. Não traz então nada que sustenta a versão do Moleque®, e o caso continua sem nada que sustente a versão do Moleque®, fora da palavra dele, que é inconsistente, e.g., que tirou foto com André e Cleci na casa de Fritz, mas que Cleci não foi nem voltou da casa de Fritz.

O que o laudo trouxe então? Pelo menos dois meses de atraso, a demora total somente saberemos quando, finalmente, o processe segue para Dr. Márcio, para quem deveria ter seguido já faz dois meses.

O atraso beneficia os culpados, e castiga os inocentes.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Os filhos do Céu

Dr. Johnson entenderia as notícias de Vila Velha

"Palavras são as filhas da Terra, e coisas são os filhos do Céu", escreveu Dr. Samuel Johnson, autor do primeiro dicionário de inglês, que entendeu muito bem o valor das palavras - e o achava inferior ao valor das coisas, da realidade que as palavras tentam captar.

Nos casos de crime inexistentes, como da Colina do Sol, do caso do professor Ricardo da Vila Velha, da caça às bruxas de Catanduva, vimos muito bem o perigo, o fascínio, o comodidade das palavras. Bordões substituem relatos específicos; teorias tecidos para cobrir qualquer circunstância, dispensam os fatos do caso em pauta; frases de efeito enaltecem a acusação e denigram a defesa.

Vamos examinar hoje umas destas frases - não todas, pois não dá espaço. Sendo que nosso assunto hoje é exatamente o uso de palavras para entortar ou disfarçar a coisa, a realidade, não vou usar meias-palavras. As palavras às quais a acusação recorre nestes casos são bullshit, "estruma de vaca", ou em bom português, merda.

"Só queremos defender as crianças"

A imprensa adora uma acusação de pedofilia, e a ecoa no volume máximo. No caso Colina do Sol, a prisão de Barbara Anner foi visto pela filha dela pela televisão em outro continente. No caso Catanduva, a suposta "rede de pedofilia" tomou conta da imprensa estadual, com mais de mil reportagens televisivos. O professor Ricardo foi preso em Vila Velha na televisão, com os acusadores no outro lado da rua, pedindo à polícia que usasse algemas.

Pedofilia, ouvimos, acontece em segredo, escondido.

Agora me responde: depois de tanta publicidade, como que é que qualquer dos acusados, poderia ser um perigo para crianças? Como poderia voltar a cometer crimes? O pelourinho colonial foi substituído pela programa sensacionalista da TV, os chicotes pelas comentaristas repetindo acusações não comprovadas, a letra escarlatina pela foto estampada no jornal. Antigamente o vilarejo sabia da acusação, hoje é o estado, a nação, ou o globo inteiro.

A acusação pública já condena o inocente, sem processo ou defesa. Mas no caso do culpado (e em acusação de "rede de pedofilia" ou abuso em escolinha, ainda não encontrei um caso que convence) a publicidade dado à acusação, já "protege as crianças".

Depois de tanta publicidade, nada devolverá a condição de inocente ao acusado. Mas igualmente, a publicidade tira qualquer possibilidade de futuros crimes escondidos. A prisão do acusado não é preciso para "proteger as crianças", a publicidade dado à acusação já fez isso.

"Se for inocente, porque está preso?"

Aqui chegamos a "coisa", a realidade atrás da bordão "queremos defender as crianças". A imprensa brasileira, e o publico que ela informa ou desinforma (conforme qual modalidade venderia mais publicidade), acredita e prega que preso é culpado, e solto é inocente. Um processo na Justiça é medido em centenas de folhas, e o tempo de noticiário é calibrado em segundos. A TV reduze tudo ao mais simples. Consegue comunicar algemas e xadrez, mas o direito de ser considerado inocente e de responder em liberdade, já foge da sua capacidade.

Vamos ver palavras típicas. No grupo de acusadores no Facebook hoje, leia-se, assinado por "Daniele Silva", que não tem cara, nem amigos, nem coragem de acusar sob seu nome verdadeiro, "Como uma pessoa que se diz inocente fica preso por 3 meses tendo um bom advogado?" Para Daniele, ou melhor dizer para a pessoa que se esconde atrás deste fake, preso é culpado.

Quando Ricardo for solto, "Daniele" vai dizer que Ricardo então deve ser inocente? Não, vai aposentar o fake, ou dizer "vamos aguardar a Justiça".

"Vamos aguardar a Justiça"

A Justiça brasileira é rápido para acusar, e lerda para julgar. Especialmente quando gente da próprio aparato de segurança e Justiça pisam no tomate, querem que seja esquecido, que o tempo enterrasse o erro.

Na caça às bruxas de Catanduva, para apreender computadores foram mobilizados 40 policiais e 20 promotores. Para examinar tais computadores, foi destaco 01 (hum) perito, que estava doente e morreu sem ter completado laudo nenhum, e nestes três anos, não foi substituído. É óbvio que nada encontraram, então pressa não tem.

No caso Colina do Sol, apareceu em abril de 2012, durante os argumentos finais do caso, um laudo sobre coisas supostamente apreendidos em 2007. Ontem conversei com alguém que falou com um perito do Instituto Criminalística gaúcho, que explicou que o IC tem trabalho muito além do que pode fazer, e algo é feito somente quando polícia ou promotoria volta a insistir. Este laudo, sem constar evidência de crime, atrasaria em no mínimo dois meses um processo que já durou mais de quatro anos, durante qual dois dos acusados morreram.

Notamos também no caso Colina, que laudos positivos apareciam no inquérito ou processo no mesmo dia, enquanto negativos feitos no mesmo dia atrasaram até 8 meses para chegar ao conhecimento da Justiça.

Claro que a defesa pode atrasar o julgamento quando o acusado é culpado, mas isso é feito através de petições. A acusação consegue o atraso pelo simples ingerência, que não aparece nos autos. E é difícil combater. A acusação pode se opor aos pedidos da defesa que atrasam; a defesa não tem como reagir quando a acusação simplesmente nada faz.

"Vamos aguardar a Justiça", é ouvido quando a acusação desmorona. O pessoal que ficou em frente do apartamento de Ricardo, aguardando que fosse preso, pedindo algemas, não estavam "aguardando a Justiça". Não, queriam que Ricardo fosse punido, e já, para algo que não passava de uma acusação, e uma acusação que não persuadia o delegado nem o promotor natural.

Porque naquela hora não dava para "aguardar a Justiça"? Afastar o professor Ricardo da escola ou das aulas talvez, colocando ele em função administrativo, mas aguardar uma sentença até puni-lo? Porque naquela hora tinha pressa para destruir a vida de Ricardo, mas agora que as fraquezas e absurdas da acusação vierem ao público, devemos "aguardar a Justiça"?

É que as palavras "vamos aguardar a Justiça", querem dizer, "vamos deixar isso para o dia de São Nunca, ou para uma hora que não é mais notícia, ou para quando prescreverem os crimes de calunia e falsa denúncia dos quais Ricardo foi vítima."

"Vamos aguardar a Justiça" não é uma expressão de respeito para a Justiça. É um pedido de impunidade para os verdadeiros criminosos.

No caso de Catanduva, o jovem William "aguardou a Justiça" quase três anos, para ser solto pelo TJ-SP sem nada da publicidade que acompanhou sua prisão e  condenação na primeira instância. As palavras do desembargador relator - estes, sim, com o brilho dos filhos do Céu - merecem ser repetidos:

"A repercussão provocada pela grande exposição dos fatos - repercussão orientada no sentido único da condenação - não pode servir como elemento de prova para base da acusação posta na denúncia e a condenação não pode ser decretada apenas em razão da gravidade das infrações imputadas, sendo indispensável que a prova da autoria venha apoiada em prova cabal e estreme de dúvidas (o clamor público não serve como prova dessa qualidade que se exige para fundamento da condenação, como é evidente)."
- Des. Antônio Luiz Pires Neto, no voto 21.173 do TJ-SP, Apelação Nº 0002341-79.2009.8.26.0132

"Acreditamos nas crianças"

Isso é a bordão principal, a invocação da inocência dos pequenos, a bandeira e o escudo da pelotão de linchamento moral. Voltaremos ao este frase, e ver atrás destas palavras lindas, a coisa real. E veremos que os palavras não são, na formulação de Dr. Johnson, da terra. São da lama, da imundice em que porcos se banham.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Relembrando Catanduva

Três anos e meia atrás, no interior paulista, em Catanduva, a "Cidade Fetiço", houve um caças às bruxas com alegações fantásticos de pedofilia. Eu fui o primeiro que publicou e assinou embaixo que era tudo mentira, no Observatório da Imprensa. Um advogado de defesa me disse que a matéria embasou o habeas corpus que livrou uns dos acusados da cadeia, homens que até hoje nem foram denunciados. Um pai me agradeceu depois para o que era, naquela hora, a única defesa no imprensa dos acusados que estavam sendo massacrados pela "grande imprensa" em peso. Uma voz conta por muito, quando é a única.

Dois meses depois, dei uma entrevista num revista de Catanduva, a énoticia da Noticia da Manha. Na minha experiência, a imprensa local acorda antes que o nacional, talvez porque tem que viver com os resultados dos seus reportagens. Não pode cagar e sair andando. Quando visitei Catanduva meses depois, fui recebido com toda cerimônia pelo presidente da Câmara Municipal, Marcos Crippa. Sua secretária me falou que a entrevista "deu muito a falar" em Catanduva. Reproduzo a entrevista abaixo na forma original.

O jovem William, sobrinho do borracheiro que ficou famoso no caso, foi condenado na primeira instância como toda publicidade, para depois ser inocentado na apelação em silêncio. Escrevi da sentença original da juíza Sueli Juarez Alonso, depois reformada pelo Tribunal de Justiça. A sentença foi uma vergonha para a Justiça paulista, comparável as das caças às bruxas de Salem, 300 anos atrás.

Amanha o habeas corpus do  professor Ricardo de Vila Velha será julgado pelo Tribunal de Justiça de Espirito Santo. É uma boa hora de lembrar o caso de Catanduva, onde a Justiça levou William para a cadeia durante três anos, para resolver depois que ele era inocente.


domingo, 3 de junho de 2012

Um laudo para apreciação

"A justiça atrasada é a justiça negada", disse William Gladstone, e o caso Colina do Sol ilustra isso bem. As vítimas inocentes das falsas acusações agonizam na aguarda da Justiça - dois dos sete já morrerem, e Bárbara está quase nos 80 anos - enquanto os autores das falsas acusações torcem para que prescreve a possibilidade de qualquer ação contra eles. Os fraudes imobiliárias da Colina do Sol continuam impunes, também.

Um caso específico disso foi o processo para garantir que Cristano Fedrigo pudesse continuar a viver na casa de Fritz e Barbara, dentro da Colina do Sol, para onde foi depois da morte da sua mãe. A corja simplesmente resolveu que ia fechar contra ele a portão que construíram em cima da estrada pública. Pode? Claro que não pode. Mas se a Justiça leva mais de um ano para considerar o caso, o que importa se for ilegal ou não?

Vimos também a velocidade incompatível dentro do caso principal. Doze laudos de exame de corpo de delito negativos, indicando que não houve sinais de abuso, demoraram oito (8) meses para aparecer no processo. Isso enquanto quatro pessoas estavam presos. Mas dois laudos "positivos", chegaram no inquérito em menos de 24 horas!

A promotoria, a polícia, e a Justiça tem poderes enormes para espalhar a acusação de imediata na imprensa, e depois atrasar o andamento do processo. A questão para os acusados num caso destes não é tanto "O que será a sentença?" mas "Quanto tempo mais vai demorar ainda?"

O laudo misterioso vai ao Ministério Público

Já falamos do laudo que apareceu no processo quando o promotor e dois dos três equipes de advogados já tinham entregue seus argumentos finais. Citamos a decisão do juiz federal MM. Dr. Murilo Mendes no caso de Gol 1907, de que um laudo apresentado pelos advogados dos pilotos do Legacy era "precluso". Chegou tarde demais.

O laudo ficou seis semanas "em conclusão" aguardando uma decisão do juiz substituto (Dra. Ângela estava em feiras). Quinta-feira o juiz mandou para a apreciação do Ministério Público.

Especulamos sobre o que este laudo poderia ser. Vale citar a MMa. Dr. Ângela, na Nota de Expediente Nº 16/2010, de 26 de fevereiro de 2010, quer dizer, faz mais de dois anos:

Com relação à perícia, o IGP já encaminhou laudo dos computadores periciados, ressalvando apenas a impossibilidade de quebra de criptografia (folha 3.838). Não há nos autos qualquer determinação judicial para nova perícia ou notícia de que ela estaria sendo feita por outro órgão de investigação. Diante disso, indefiro o pedido que pugna pela expedição de ofício a gabinete de senador. Intime-se. O autor da ação deverá se manifestar – vez outra – sobre a (conclusão da) prova pericial.

O jornalista goza do sigilo do fonte.
Do que se trata? Os advogados da defesa já conseguiram cópia do laudo. Eu já sei do conteúdo, e como jornalista tenho direto de resguardar o sigilo dos meus fontes.

Eu já tenho segurado informações ao pedido da defesa, por exemplo das "pegadinhas" que queriam que fossem publicadas somente depois do que o promotoria já tinha se manifestado, e não teria mais como corrigir as falhas.

Não vou, por enquanto, explicar o laudo misterioso. O motivo esta vez não é pedido da defesa. É que tenho leitores na Justiça e no Promotoria, e prefiro que a digníssima Promotor de Justiça Dra. Natália Cagliari suasse a camisa para entender o laudo, e sua utilidade, ou para dizer melhor, falta de utilidade para comprovar qualquer dos crimes alegados, ou qualquer outro crime. O juiz substituto mandou o laudo para a promotora apreciar. Que ela aprecia, então.

Para quem serve a demora?

Um dificuldade de um linchamento na imprensa é que geralmente os advogados da defesa imaginam que estejam defendendo um caso criminal, enquanto a polícia está fazendo uma batalha publicitário, em que ela detém todas as armas.

Faz a acusação com toda estardalhaço, com a presença da imprensa nacional. Faz acusações polêmicas, de crimes horrendas, da altura da sua condição de "fonte oficial".

A imprensa procura na polícia não tanto informação, quanto impunidade. Reproduzindo as declarações de um "fonte oficial", ainda sem verificar, e ainda sabendo absurdas, podem alegar que estão "informando".

A defesa não é fonte oficial. Nem pode citar documentos que comprovam a fraude, pois a polícia sonega o inquérito. Na hora que a defesa finalmente tem aceso às informações que pode comprovar que a polícia está mentindo, vem o "sigilo da Justiça", que amordaça a defesa, e fornece à polícia uma desculpa para não ter que explicar suas mentiras e contradições.

Falamos hoje da demora. A polícia não precisa comprovar um crime. Precisa somente atrasar o processo até que os acusados não podem mais processar a polícia, nem na Justiça criminal nem na civil. O acusado, inocente, fica preso e gasta tudo que tem para se defender; o culpado, alcance a impunidade. Não é precisa ter a razão, é suficiente provocar a demora.

E a imprensa? É chato admitir "mentimos". É chato, e até perigoso, apontar conduto criminal da polícia, fonte diária de acusações. Às vezes a única maneira de explicar a inocentação dos acusados, é dizer, "a polícia mentiu". Mais cômodo dizer que não é mais notícia, e deixe para lá. O direto de informar, parece, só vale para acusar quem não pode se defender.

As ladainhas de sempre

Reportagem exige trabalho. E a imprensa brasileira não possua marcha ré. Em vez de entender e explicar uma sentença de inocente, é mais fácil recorrer para as ladainhas de sempre. Poupe trabalho. Poupe a necessidade de informar os crimes da polícia, os parceiros de sempre da imprensa sensacionalista. Poupe a necessidade de admitir os próprios erros, e os próprios crimes.

Pois não há dúvida: o comportamento da imprensa no caso Colina do Sol não foi "erro", não foi "deslize", não foi "a custa da democracia decorrente da pressa em informar o público": foi crime, mesmo. E a imprensa prefere não admitir. Uma imprensa livre vale qualquer preço - sendo, é claro, que são os outros que paguem. Inocente poder ser arruinado, inocente pode ir preso, mas jornalista pagar o "preço da democracia?" Isso seria um escândalo! Abafa isso, esquece isso, e vamos correr para acusar o próximo inocente.

O que a polícia pretendia?

Era para este laudo ser rejeitado pela juíza, por ser tarde. Assim, seria armado a desculpa da polícia. "A polícia prende, e a Justiça solta." "Conseguimos as provas, mas os pedófilos escaparam por um tecnicalidade." "Demorou? Sim, porque a polícia não tem os recursos necessários para processar as evidências e produzir as provas contra estes criminosos. É preciso mais orçamento para que não volte a acontecer."

Tudo isso era possível, como o laudo rejeitado por ser tardio. Mas o juiz substituto cortou o barato. Mandou para o Ministério Publico para apreciar o mérito. E este laudo não tem mérito nenhum. Vai ser julgado irrelevante, de "evidências" aparecendo de lugar nenhuma sem provar coisa sequer.