domingo, 25 de abril de 2010

Os outros laudos psiquiátricas

Três dos jovens de Morro da Pedra foram examinados por psiquiatras autênticas, em 17/12/2007, os laudos sendo citados para justificar a prorrogação da prisão dos quatro acusados. Os laudos produzidos, porém, são contaminados pelas pareceres da falsa psiquiatra Dra. Heloisa Fischer Meyer, e outros dados falsos. Além disso, são tão iguais que parecem mais processados do que escritos.

Nos laudos, há muito teoria, e um único indício que "permit[e] manter este hipótese [de abuso sexual]", que é que: "há um relato, por parte da escola, de prejuízo no desempenho escolar e conduto sexualizada." Até se for verdade, seria um indício fraco - quantos adolescentes tem queda de desempenho escolar? - mas como vamos ver, é mentira: não há nenhum relato de escola de conduto sexualizado, e nenhum sobre o desempenho escolar dos três periciados.

Todos os três laudos incluem a conclusão de que "O relato do periciado apresenta características que comprometem sua credibilidade." Bem, examinando os laudos e os fatos, chegaremos numa outra conclusão, que é que são os próprios laudos que "apresentam características que comprometem sua credibilidade."

Laudos padronizados

Os três laudos são quase idênticos, palavra por palavra. Diagramei um laudo em baixo, e o que está igual está em cinza clara.

Enquanto não posso discordar da eficiência desta maneira de proceder, me parece que para manter quatro pessoas presos, é devido mais do que um laudo "prét-à-porter", levemente alterado para que a conclusão padrão pode vestir qualquer entrevistado. Vamos ver as sinais deste procedimento:

  1. Na "CONCLUSÃO" e a "RESPOSTA AOS QUESITOS" não há nem uma vírgula de diferença entre os três laudos.
  2. Os COMENTÁRIOS MÉDICO-LEGAIS não tem nem uma vírgula de diferença entre os irmãos G.F.D. e R.A.S.
  3. Os COMENTÁRIOS MÉDICO-LEGAIS sobre J.A.S. tem diferenças leves de fraseologia do texto sobre seus irmãos, e incluem quatro sentenças sobre a entrevista anterior com a falsa psiquiatra Dra. Heloisa Fischer Meyer.
  4. Os nomes e datas de nascimento dos três irmãos variam, que é de esperar. O laudo do G.F.D que reproduzimos abaixo, porém, não tem a data do nascimento dele: dia e mês são do R.A.S., com somente o ano mudado. Está também inserido no frase num posição diferente do que nos laudos dos seus irmãos.
  5. Os três são filhos de Sirineu Pedro da Silva, mas G.F.D. é adotado, e no seu certidão de nascimento, os nomes dos pais não batem com os que está no laudo.

"Há um relato, por parte da escola ..."

O único indício que "permit[e] manter este hipótese [de abuso sexual]", é que: "há um relato, por parte da escola, de prejuízo no desempenho escolar e conduto sexualizada." Este relato nada tem a ver com estes jovens periciados.

A sra. Carla Jordana Ronnau Bomerich, diretora da Escola Estadual Dona Leopoldina, fez depoimento para a Polícia Civil em 14/12/2007, três dias depois das prisões.

Enquanto o "Termo de Declarações" disse que o depoimento aconteceu em Porto Alegre, ouvi que ela falou na Justiça que seu depoimento foi colhido na própria escola. Ela foi ouvida pela inspetora Rosie C. dos Santos. Inspetora Rosie, lembramos, estava presente na delegacia de Taquara na noite que, ao que tudo indica, os filhos de Isaías Moreira sofreram coação, e ela forjou outras evidências no processo.

Mas o que foi que Diretora Bomerich disse? Ela mencionou os nomes de cinco alunos, três meninos e duas meninas, e fala dos "filhos de Sirineu." Ela disse ainda que:

... um grupo de alunos seletos da referido Escola frequentava desde o ano de 2005, em horário inverso ao horário de aula, o reforço escolar patrocinado pelo ONG de FRITZ, tendo atingido o auge no ano de 2006 [...] Que a partir daí os alunos começaram a ter desinteresse pela escola, com baixíssimo rendimento escolar e baixa frequëncia. Apresentavam sinais como estarem absortos e sonolentos na sala de aula. Inclusive os alunos eram vistos durante e fora do horário de escola, nas estradas.

A nenhuma momento, nos quatro páginas de depoimento, a diretora faz referência a "conduto sexualizada". E não há no inquérito, certamente não antes de 17/12/2007, mais nada que pode ser considerado um "um relato, por parte da escola".

Seria realmente melhor verificar o que a diretora Bomerich disse na Justiça, onde suas palavras não passaram pela inspetora Rosie para chegar no papel. Infelizmente, este depoimento não está entre as papeis que foram incluídos no processo de Novo Hamburgo, perdendo assim o sigilo.

Relato não é sobre estes três

Porém, outros documentos interessantes foram incluídos, inclusive o Histórico Escolar dos três (fls 321-323). Já falamos das duas escolas públicas de Morro da Pedra, a Escola Municipal de Ensino Fundamental Dona Leopoldina, e o Colégio Jorge Fleck.

A diretora Bomerich falou sim dos "filhos de Sirineu", mas Sirineu tem nove filhos. Um dos periciados já estava no Jorge Fleck desde 2004, e os outros dois desde o começo de 2005.

Sem fundamento

Vemos então enquanto estes laudos foram feitos por psiquiatras de verdade:

  • Com mais de 90% do texto igual entre os três laudos, e a pista da data de nascimento trocada, podemos concluir que os laudos foram feitos com menos cuidado do que aparentam;
  • Os laudos somente concluem que abuso sexual não poder ser descartado, e o único fato que sustenta isso é de que "há um relato, por parte da escola, de prejuízo no desempenho escolar e conduto sexualizada.";
  • Há somente um relato da escola, e este não fala de "conduto sexualizado";
  • Na época em que o depoimento da diretora aponta queda de rendimento escolar, os três periciados já não eram mais seus alunos, o relato então não se referindo a eles;
  • Até se tiver queda de rendimento, o depoimento oferece uma explicação muito mais direta por isso - sonolência devida aos atividades extras, matando aula, e trabalho aos sábados - do que a teoria bastante mais ténue de abuso sexual.

Os três Laudos de Avaliação Psiquiátrica aqui referidos estão nas fls. 597-605 do processo 070/2.07.0002473-8 do Caso Colina do Sol, e nas fls. 307-316 do processo 019/1.09.0007874-0, donde é permitido tirar cópias, sendo que está fora do "sigilo de Justiça". São Laudo 38622-2/2007, Laudo 38688-2/2007, e Laudo 38691-2/2007. Os histórios escolares dos três (que não coloco aqui por questões de privacidade) estão nas fls. 321-323 de processo 019/1.09.0007874-0. O depoimento da diretora Bomerich estã nas fls. 334-337 do processo 070/2.07.0002473-8, e nas fls. 317-319 do processo 019/1.09.0007874-0.

Mais uma vez, a questão de privacidade

Censurei os nomes dos jovens nos relatos. Deixei os nomes dos seus pais, pois a Promotora já deu bastante publicidade a quem eles são, lhes denunciando. A data de nascimento errada deixei, sendo que serviria somente para mis-identificação.

E realmente, estes laudos contam tão pouco sobre os sujeitos, que é difícil encara-los como uma invasão de privacidade. Os boletins escolares contam muito mais sobre os jovens do que estes poucos páginas repetitivas que são mais de metade teoria.

O que os laudos tem de desabonador é a teoria, por parte dos peritos, de que os jovens falaram o que falaram, porque suas famílias são economicamente dependentes no Fritz Louderback.

Eu também tenho um teoria. É que os peritos escreverem o que escreveram, porque suas famílias são economicamente dependentes na Secretaria de Segurança Pública, que tinha falado muito, e alto, contra Fritz Louderback.

Creio que sustentei minha teoria, melhor do que eles sustentaram a teoria deles.

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
SECRETARIA DA JUSTIÇA E DA SEGURANÇA
INSTITUTO-GERAL DE PERÍCIAS
DEPARTAMENTO MÉDICO-LEGAL

Laudo 48691-2/2007
Protocolo 64809/2007

LAUDO DE AVALIAÇÃO PSIQUIÁTRICA

G.F.D., do sexo masculino, nascido em 02/10/1994, filho de Sirineu Pedro da Silva e Dinamar Regina Fernandes, estudante, residente na Estrada da Gota, s/n.º – Taquara.

REQUISIÇÃO: 2ª Delegacia de Homicídios/ DEIC.

DIFUSÃO: 2ª Delegacia de Homicídios/ DEIC – 700220.

DATA E LOCAL DA PERÍCIA: Dia 17/12/07 no Centro de Referência ao Atendimento Infanto-Juvenil – CRAI (Hospital Materno-infantil Presidente Vargas).

HISTÓRICO: Perícia solicitada pela autoridade requisitante em virtude de suspeita de abuso sexual.

PROCEDIMENTOS: Foi realizada entrevista utilizando a técnica conhecida como Entrevista Cognitiva Aprimorada[1], para a qual existem evidências científicas que comprovam sua capacidade de incrementar a qualidade e a quantidade nos relatos testemunhais e de vítimas. O conteúdo da entrevista é analisado de acordo com a metodologia conhecida como Análise da Validade da Declaração[2], que estabelece critérios científicos que permitem avaliar a credibilidade do relato infantil. Em um segundo momento, é feita a avaliação clinica do estado mental do periciado.

ENTREVISTA COM G.F.D.: Inicialmente, fala de sua escola e das suas atividades preferidas. Quanto ao motivo desta perícia, relata que conheceu Frederic, vulgo Fritz através de seu irmão. Não tem queixas em relação a Fritz. Refere que Fritz tem ajudado muito a sua família e que lhe deu roupas, tênis e uma bicicleta. Freqüenta a escolinha de futebol com seus irmãos. Afirma que Fritz jamais cometeu qualquer tipo de abuso ou maltrato. Diz frequentar a casa de Fritz junto com seus irmãos e outros meninos e que nunca viu nenhuma atitude suspeita de Fritz.

AVALIAÇÃO DO ESTADO MENTAL E DA PSICOPATOLOGIA: ASPECTO GERAL: vestido com roupas novas e higiene bem feita. ATENÇÃO: sem alterações no momento do exame. ORIENTAÇAO: orientado no tempo e no espaço MEMÓRIA: preservada. SENSOPERCEPÇÃO: sem alterações. PENSAMENTO: sem alterações. [J.A.S.: demonstra preocupação em denfender (sic) o Sr. Frederic AFETO: discretamente ansioso durante a entrevista. LINGUAGEM: adequada a sua faixa etária; INTELIGÊNCIA: clinicamente na média. COMPORTAMENTO: há um relato, por parte da escola, de prejuízo no desempenho escolar e conduto sexualizada.

COMENTÁRIOS MÉDICO-LEGAIS:O periciádo não apresenta limitação alguma de ordem psicológica ou limitação em suas capacidades cognitivas que o impeçam de emitir um relato válido. Suas capacidades lingüísticas, intelectuais, de memória e perceptivas permitem que forneça um relato compreensível. Sua atitude durante a entrevista demonstra preocupação em defender o Sr. Frederic das acusações de abuso [J.A.S: "e em descrever-lo como uma pessoa boa, que ajuda a todos da sua comunidade.] Enumera uma grande quantidade de presentes que recebeu do mesmo. Tendo em vista esta atitude do periciado durante o presente exame, não e possível indicar, com maior grau de certeza, a ocorrência de abuso sexual ou ato libidinoso, todavia, o tipo de relacionamento estabelecido entre o periciado e o Sr. Frederic, caracterizado por uma forte vinculação de dependência econômica, [J.A.S.: "grande vinculação e quase devoção"] lança dúvidas quanto a credibilidade das declarações feitos pelo menino. A relação de envolvente sedução entre abusador e vitima e a existência do segredo foram descritos em diversos estudos científicos que investigaram o tema do abuso sexual. O abusador manipula a dependência e a confiança da criança, incitando-a a participar dos atos abusivos os quais apresenta como um jogo ou uma brincadeira. Para obter a participação e o silêncio da vítima, ele pode dar presentes, dinheiro ou usar de meios coercitivos ou chantagem, de modo a convencer a vítima de que a revelação do abuso representa um perigo para ela ou para sua família. A presença deste modelo de interação pode ser considerado como um indicador da existência do abuso sexual. (Juárez López, J.R. La credibilidad del testemonio infantil ante supeuestos de abuso sexual: indicadores psicossociales. Tese de Doutorado, Universidade de Girona, 2004). [J.A.S.: "Nota-se, ainda, uma mudança de comportamento e do discurso do periciado em relação ao primeiro exame realizado pela Dra. Heloisa Fischer Meyer em 11/12/2007. No exame atual, J.A.S. demonstra maior empenho em convencer o entrevistador, com respostas mais prontas e mais diretas. Isto pode ser indício de que tenha sido treinado ou de que ele mesmo tenha se preparado para fornecer tais respostas. Outra hipótese é a que este seja um viés decorrente da seqüência de entrevistas pelos quais passou o periciado desde o início da investigação."]

CONCLUSÃO: O relato do periciado apresenta características que comprometem sua credibilidade. Não é possível, neste exame, determinar a ocorrência de abuso sexua1 ou ato libidinoso, embora haja indícios que permitem manter esta hipótese e indicar a realização de novos exames para melhor esclarecimento do caso.

RESPOSTA AOS QUESITOS:

  1. O periciado apresenta ou apresentou, na época dos fatos relatados, alterações psíquicas e/ou comportamentais? Caso positivo, quais? A partir das informações prestadas pelo periciado, não temos elementos para responder. Há um relato, por parte da escola, de prejuízo no desempenho escolar e conduta sexualizada.
  2. Existem sinais e/ou sintomas de transtorno mental? Caso positivo, quais? Não.
  3. Se presentes, tais sintomas e/ou alterações são frequentemente encontradas cm vítimas submetidas a ato sexual e/ou ato libidinoso? Sim.
  4. Se presentes, tais sintomas e/ou alterações são frequentemente encontradas em vitimas submetidas à estimulação sexual precoce, inadequada para a idade? Sim.
  5. O relato do periciado preenche critérios de credibilidade? Porquê? A credibilidade esta prejudicada em função do tipo de relacionamento estabelecido entre o periciado e o acusado.
  6. Observa-se no relato do periciado sinais de influência e ou indução? Porquê? É possível a existência de pressões externas ou outras motivações para prestar informações falsas, tendo em vista a extrema dependência econômica da família do periciado em relação ao acusado.
  7. Existe nexo causal entre a situação relatada e os sintomas apresentados? Em tese, sim.
  8. O periciado apresenta atualmente sofrimento psíquico em decorrência da situação relatada? A partir das informações prestadas pelo periciado, não temos elementos para responder.
  9. O periciado apresentou sofrimento psíquico, no passado, em decorrência da situação relatada? A partir das informações prestadas pelo periciado, não temos elementos para responder.





Dr. Luis Roberto Dorneles Benia
Perito Médico-Legal Psiquiatra (relator)


Dra. Vera Regina Bertoi
Perito Médico-Legal Psiquiatra (revisor)



[1] A Entrevista Cognitiva Aprimorada, na sua forma atual, representa a aliança de dois campos de estudo: comunicação e neurociência. Esta entrevista utiliza os procedimentos recomendados em diversos países para conduzir entrevistas com testemunhas e vítimas. É um conjunto de estratégias cognitivas, testadas em diversas pesquisas, com o objetivo de melhorar a recordação dos entrevistados. Após uma fase inicial de acolhimento e estabelecimento de vínculo com o entrevistado, pede-se a este um relato livre sobre os eventos em pauta na entrevista. Durante todo o processo, o entrevistador interrompe o mínimo possível e faz perguntas abertas e não-sugestivas. Existem evidências científicas de que a utilização destas técnicas aumenta a acurácia dos relatos de testemunhas e de vítimas, bem como aumenta a produção de informações juridicamente relevantes (Nygaard, M.L., Feix, L.F. & Stein, L.M. Contribuições da psicologia cognitiva para a oitiva da testemunha. Revista do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, 14 (61):147-180, 2006).

[2] A avaliação da validade da declaração (Statement Validity Assessment – SVA) é reconhecida como a técnica mais difundida no mundo para medir a veracidade de uma declaração verbal Sua origem data de 1954, na Alemanha, e sua metodologia foi aperfeiçoada em 1989, por Steller e Kõhnken. Na sua forma atual, é aceita como evidência em tribunais de vários países da Europa. No processo de análise da declaração, é realizada uma avaliação sistemática do relato da criança através de critérios estabelecidos objetivamente. Esta técnica é conhecida como CBCA (criteria based content analysis). Para maiores informações sobre estes instrumentos, ver: Rovinski, S.L. Fundamentos da perícia psicológica forense. São Paulo: Vetor Editora, 2004.

Laudo de Avaliação Psiquiátrica 48622-2/2007

Laudo de Avaliação Psiquiátrica 48688-2/2007

Depoimento da Carla Jordana Ronnau Bomerich


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