segunda-feira, 18 de julho de 2011

Velocidade incompativel

O processo Colina do Sol agora está com o Ministério Público para seus argumentos finais. O que emperrava o processo era o laudo sobre a máquina fotográfica de Fritz Louderback. Pedido pela juíza com "urgência máxima" desde 2008, chegou no Fórum em 10 de junho.

O laudo estava pronto desde 24 de abril, mas a polícia segurou mais seis semanas. É consistente com o que aconteceu durante todo o processo. E é inconsistente com qualquer padrão de isenção ou de Justiça.

Um pouco de teoria, e depois vamos ver com detalhes a velocidade incompatível de evidências favoráveis à defesa (quase a totalidade) e à acusação (poucos, preliminares, e sem valor jurídico) no processo.


Há, no processo criminal, uma assimetria de tempo. A prisão é rápido, mas o processo demora.

A cobertura da mídia, que assegura a divulgação imediata e maciça da acusação, enquanto o veredito ganha muito menos espaço ("já passou muito tempo, não é mais notícia", " 'Fulano é inocente' não é noticia", etc) multiplica esta assimetria.

Enquanto a lerdeza do processo é visto no Brasil como sinal de impunidade, nos EUA, é visto como injustiça contra o acusado: 6ª emenda à Constituição garante "o direito de um processo rápido" entre os direito fundamentais.

Assimetria necessária

Parte desta assimetria é necessário. Não se pode imaginar que evidências fossem recolhidas devagar, e exames científicos fossem conduzidos à toque de caixa.

Reclamar que coisas que são da natureza do mundo sejam "injustiça", é discurso de tolo. Sim, há uma diferença de velocidade que pune o acusado que for inocente, e sim, tanto o pessoal da segurança pública, quanto da imprensa, agem para multiplicar em vez de diminuir esta injustiça. Há coisas que podem e devem ser melhoradas.

Existem distorções como no caso Catanduva, onde 40 policiais e 20 promotores foram acionados (e a imprensa informada antes do procedimento "sigiloso", para que poderia registrar-lo) para apreender computadores, e um perito colocado para examinar-los, que logo morreu e não foi substituído. Merece regras, para que quando o Estado gastar para acusar em alto volume, tem que apurar com rapidez compatível.

Imagine uma empresa que gastou para encher a fábrica de matéria-prima, e depois disse que não tinha recursos para pagar funcionários para transformar-la em produtos. A situação de Catanduva é igual. Se a investigação policial serve para fornecer provas para o judiciário, agiu muito mal. Se for para fazer espetáculo para a mídia, foi primoroso.

Polícia e processo

Também, não se pode confundir a ação da polícia com a da Justiça. Um juiz não deve emitir sentenças baseadas em somente indícios , da mesma maneira que um delegado não pode perseguir assaltantes com serenidade e equilíbrio.

São ritos distintos, com fins distintos. Enquanto o descompasso entre a apreensão dos dados e sua apuração em Catanduva é tudo sob as regras e a rubrica de segurança pública, um processo na Justiça, segue outro norte, por outros meios.

Comparar a rapidez de acusar da polícia, com a demora de julgar da Justiça, é então comparar coisas distintas, é misturar alhos e bugalhos.

Situações iguais

Porém, pode ser não somente esperado, mas exigido, que coisas iguais sejam tratadas de maneira igual. Não há motivo teórico, prático, ou até orçamentário, para que resultados de exames que favorecem a defesa, chegam na Justiça mas lentamente do que resultados que poderiam sustentar a acusação.

No caso Colina do Sol, os resultados de exames que inocentam os réus, chegaram ao Fórum de Taquara, com uma lerdeza extraordinária. Enquanto um exame de corpo de delito positivo (negado pelo periciado, e sem valor jurídica por faltar uma assinatura) chegou no processo em oito horas, meia-dúzia de exames negativos, feitos ao mesmo tempo, levaram oito meses para chegar ao conhecimento da juíza e da defesa.

Laudos de corpo de delito

Nós já tratamos em detalhes os exames de corpo de delito - os exames médicos, para constatar sinais físicos de algum abuso.

Reproduzo parte do que escrevi naquela data:

As prisões acontecerem no dia 11/12/2007. Exames de corpo de delito foram feitos no dia 17/12/2007 em Porto Alegre; dia 18/12/2007 em Taquara; e em 06/03/2008, em Taquara.

Doze laudos negativos, indicando que não houve sinais de abuso, demoraram oito (8) meses para aparecer no processo. Enquanto quatro pessoas estavam presos.

Coloquei uma tabela no postagem do link acima. O resultado dos exames feitos em 17/12/2007, chegaram ao processo em 20/08/2008, oito meses depois e três dias depois. Exames feitos no IML de Taquara, em 06/03/2008, apontaram no processo em 07/11/2008, oito meses e um dia depois. No processo, todos estes laudos são negativos, e todos menos um tem laudos preliminares e finais.

Porém, há laudos positivos para LAM e O Moleque que Mente®, feitos na tarde de 18/12/2007, que chegaram no inquérito no mesmo dia.

Antes dos meus leitores pensam, "resultado positivo é importante, negativo não é": no caso de LAM, ele negou qualquer abuso (e afinal, seria o primeiro de saber se houvesse); um laudo posterior por um proctólogo particular, atesta que não há sinais de abuso; e este laudo é somente preliminar, sem duas assinaturas, e então sem valor legal de prova. No caso do MQM®, o laudo também é preliminar; e o legalista afirma que não há sinais físicas de abuso, somente a palavra do Moleque.

Mas ainda haveremos postagens dedicados aos casos do LAM e O Moleque que Mente®. Hoje estamos falando de velocidade das informações. Que a polícia entregou os laudos "positivos" no dia que foram feitos, e segurou os negativos por oito meses, prejudicou uma visão isento da Justiça, baseado no totalidade das evidências.

Laudos de informática

Nos computadores, é a mesma história. Não fizemos, ainda, uma tabela de datas. Mãos à obra, então.

Listamos na tabela em baixo, os vários laudos, incluindo a página e a data e que entraram no processo, quando sei. Há casos, como o relatório do agente de FBI americano, em que a cópia que tenho não veio pelo processo, e outros quando os papeis que foram postos fora do sigilo, não tem as datas, e olhei o que estava de papeis anteriores e posteriors.

ResultadoNúmeroItemDataFolhaData nos autos
Preliminar27276/07 Micro Fritz29/12/2007658-67210/01/2008
Negativo1965/08Barbara/
Cristiano
07/03/20083850-385910/07/2008
Negativo1966/08Compaq/
Toshiba
19/05/20083841-384910/07/2008
Negativo24714/0827 CDs04/12/20084605-461227/03/2009
Indícios9677/08HD externo28/05/20083835-384010/07/2008
Negativo17.715/08 Fitas vídeo
e DVDs
27/08/20084064-406601/10/2008
Negativo3654/09Camera
André
25/03/20094615-4618?
PreliminarRelatorio FBIMicro Fritz/
HDs externo

15/04/20114068-408402/10/2008

De novo, antes que meus leitores fiquem distraídos pelo anotação de que um relato mostrou "indícios" num disco externo, aponto para o postagem que trata deste disco, e explica quanto são frágeis os "indícios".

Demora de 1 a 4 meses

Vimos aqui de novo a demora. As vezes, é mais que os simples semanas, com quatro réus presos: o CPI do Senado Federal investigou o caso em junho de 2008, enquanto quatro laudos de computadores estavam prontos, mas nas mãos da polícia, que os sonegou da Justiça e em conseqüência, do Senado.

Relatórios preliminares

Os dois relatórios sobre o micro de Fritz Louderback são "preliminares". O do agente do FBI americano John D. Whitaker fala que "a investigação continua", mas não chegou em lugar nenhum. Fala grossa, mas nos detalhes ... nada.

E o equivalente forense do pedido de empréstimo para o Hotel Ocara, que classifico como estelionato. As palavras do Celso Rossi dizem que o hotel daria muito lucro, mas numa leitura dos números, o fraude salta aos olhos. O relato do agente do FBI é a mesma coisa: insinua muito, mas os específicos comprovem que nada foi encontrado.

Vale notar que tanto o relatório do agente do FBI, e o relatório do IGP/IC sobre o micro de Fritz, são "preliminares". Porque, depois mais de três anos, ainda não há um relatório final?

No caso do micro de Fritz, uma pista vem num relatório posterior. Como já destacamos aqui,

Um laudo posterior, 1966/08, diz que

Foram encontrados imagens de pessoas nuas, porém contextualizadas ao "nudismo/naturismo" e sem a presença de pornografia (práticas sexuais, cenas obscenas, etc.)

As imagens encontradas não diferem das já apresentadas nos Laudos de números 27276/2007 [fls 658-672] e 1965/2008 [fls 3840-3859] enviados anteriormente.

O Departamento de Criminalística reconhece, então, que estes fotos não são pornografia.

Talvez o IGP/IC pensou que um relatório final dizendo que nada encontrou seria um acréscimo redundante, ao um relatório preliminar que nada encontrou.

Meses e horas

Vimos, então, que enquanto a velocidade dos relatórios que nada encontraram pode ser medido em meses, os que levantavam alguma suspeita, tão tênue que fosse, aportaram em horas. Sua luz era pálida, mas não sendo ofuscada pelas frases claras e redondas dos relatórios que inocentavam os réus, era a única luz que a juíza tinha para julgar os pedidos de relaxamento de prisão.

A máquina fotográfica de Fritz Louderback

A última laudo foi da máquina fotográfica de Fritz. Merece um tratamento especial, de todos os pedidos para a realização da perícia, e todas as andanças.

Mais acabou de chegar uma notícia quente, e deixamos a máquina de Fritz para a próxima.

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