quarta-feira, 7 de março de 2012

Pegadinhas

O olhar jornalístico e o olhar jurídico enxergam de forma diferente as "pegadinhas". Perante a lei, há exigências e procedimentos que se não foram respeitados, implicam na inocentação do réu.

O jornalismo brasileiro, sempre ao lado da acusação, mantem prontas duas explicações-padrão que dispensam a inconveniência de examinar provas ou argumentos. Uma é, "a polícia prende e o judiciário solta", outra predileta é, "só pobre vai preso no Brasil".

Nosso abordagem aqui sendo diferente - não temos medo de fatos, nem de trabalho, nem de admitir nossos próprios erros - vamos examinar hoje umas das cartas que os advogados da defesa guardaram na manga. Há de fato umas "pegadinhas" e uns "pulos de gato" no caso Colina do Sol, que me pediram para não divulgar antes que fosse tarde demais para que as falhas grosseiras da acusação poderiam ser remendadas - evito a palavra "corrigidas".

Pegadinhos e error grossos

Há "pegadinha", e há algo mais. Por exemplo, o relatório da polícia e a denuncia da promotora afirmaram que os filhos de Sirineu foram abusados, baseado no relato da diretora da escola Dona Leopoldina, de que tinham "queda de rendimento escolar". Os três filhos listados como vítimas, já estudavam na outro escola, o Colégio Jorge Fleck, desde um ano anterior à suposta "queda de rendimento". Isso é uma problema de substância, pois comprova que o relato dela nada tem a ver com as vítimas. O depoimento dela afirma que foi feito na Delegacia de Homicídios em Porto Alegre, mas a diretora afirmou em juízo, que foi feito na própria escola. Isso é somente "pegadinha", mas igualmente, invalida o relato, e os laudos baseadas nele.

A dúvida, no caso Colina do Sol, não é o "último dos argumentos" da defesa. De fato, é o último dos argumentos da acusação, que enfrentando o fato que todas as crianças do Morro da Pedra negam abuso, alega que todos poderiam ter sido comprados, junto com seus pais e vizinhos. É, mesmo, um argumento da última categoria.

Os laudos sem assinatura

Mas com 14 vítimas no caso Colina do Sol, tinha dois laudos médicos "posítivos": os de L.A.M.m e d'O Moleque que Mente®. Seria a esperança da promotoria? Aqui vem a pegadinha: os dois laudos eram preliminares, como somente uma assinatura. Não valem, então, como prova.

Mas tinham problemas mais substanciais. No caso de L.A.M., ele negou abuso para o legalista; para a polícia; e em juízo. E afinal, ele seria o primeiro a saber. Ele ficou inconformado com o laudo, e seu pai o levou para um médico particular especializado (proctologista) que afirmou que não tinha sinais de abuso.

Revelação? Não, contradição.

As depoimentos do Moleque que Mente® contam várias versões contraditórias. Claro que a polícia e os psicólogos que tem o abuso como artigo de fé, tem explicação em que cabe tudo: enquanto acusado "entre em contradição", vítima cujas versões não batem "continua fazendo revelações". Para este pessoal, o relato mais escabroso, é sempre o mais confiável.

A falta de assinatura é somente a "pegadinha". Vamos ver a substância.

O laudo - "Auto de exame de corpo de delito" nas fls 394-395 do processo, foi feito em 18/12/2007 pelo legalista Dr. Sami A. R. J. El Jundi,. Neste laudo, Dr. Sami escreveu que o Moleque® afirmou que :

"... foi levado a localidade conhecido como Colina do Sol; que lá tirou várias fotos nu; que as fotos foram postados no Orkut; que o tio André e tia Cleci dormiram com ele e passaram a mão em seu corpo, em relação ao que mostrou-se desgostoso e contrariado; que ia ser adotado e levado para os Estados Unidos."
[...] "Vincula com muito facilidade, estando sempre pronto para agradar seu interlocutor, o que deve ser levado em consideração tanto quanto se avalia seu relato, como quando se considere sua particular vulnerabilidade ..." [...] "Os achados negativos ao exame físico são compatíveis com seu relato, uma vez que os atos imputados não costumam deixar vestígios físicos, não permitindo, por si só, confirmá-lo ou negá-lo. "

Onde isso nos deixe? Os achados do exame físico foram negativos; os atos imputados não costumam deixar vestígios; o exame não confirma nem nega.

Mas agora, vamos ver os outros depoimentos do Moleque®. Em juízo, disse que:

'Daí o Tio André tirou a minha roupa de noite e colocou o tico na minha bunda" (fl. 1743).

Perguntado pelo Dr. Campana se doía, o Moleque® respondeu que sim, mas não saiu sangue.

Agora, vamos comparar isso com o laudo do Dr. Sami. O exame físico foi compatível com um relato de que alguém tirou foto ou passou a mão. Mas o depoimento em juízo é outro, de sexo anal, que doía.

O laudo então formalmente não é válido, por faltar a segunda assinatura. Materialmente (que é palavra de advogado para dizer que está falando de substancia) a validade é questionável, como se o legalista tivesse examinado um menino que disse que caiu de bicicleta, e que depois afirmou que caiu de ônibus. Os machucadas compatíveis com um, não são compatíveis com o outro.

Indicaram o que queriam ouvir dele ?

Outras contradições

Nos já vimos os contradições e incoerências com as evidências objetivas d'O Moleque que Mente® sobre os três bebês na banheira e sobre as supostas fotos na colina.

Dr. Sami tinha razão quando avisou que o Moleque® estava "sempre pronto para agradar seu interlocutor". Quando eu fui pela primeira vez em Taquara, apurando este caso, visitei o orfanato - e de pronto, o Moleque® inventou mentiras sobre mim. Comprovei a mentira: ele disse que me viu em Taquara quando eu estava em Fortaleza. A assistente social, ou quem sabe a promotora (pois Apromim e o Ministério Público ficam no mesmo quarteirão) queria acusar quem ousavam chamara a farsa de uma farsa, e o Moleque inventou uma história que acolherem sem examinar. Aconteceu comigo. Porque não teria acontecido também com André e Cleci?

Os "indícios" evaporaram

Uma das justificativas pela prisão dos acusados, foi que tinha laudos de corpo de delito. Há no processo sete autos de exame de corpo de delito válidos, e um atestado de médico particular, e todos são negativos - e, como já mostramos, a polícia os entregou a Justiça depois de 8 meses, em média. Dois foram encaminhados no mesmo dia que foram feitos, os descritos hoje, do Moleque que Mente® e de L.A.M.. Mas são preliminares, sem validade jurídica, e os laudos finais nunca foram entregues, se chegaram mesmo a ser elaborados e assinados. E agora é tarde.

Os laudos de corpo de delito válidos são unânimes em apontar que não houve sinais de abuso, da mesma maneira que os laudos das evidências foram unânimes em dizer que não tinha pornografia infantil.

Um processo que ouviu mais de 70 testemunhas, preencheu mais de 5.000 páginas, e sobreviveu dois dos acusados, não deve ser decidido por "pegadinhas". Mas o laudo de L.A.M. foi desmentido pela própria "vítima" e por outro laudo, e o laudo do Moleque®, somente afirme que o legalista nada constou. A falta de assinatura, a falta de validade, somente garante que não podem ser usados para fundamentar uma condenação.

Fica o que, então?

Vimos hoje que o único indício físico de que alguma das vítimas sofreu algum crime (que ainda assim não identificaria um autor), o laudo de L.A.M., não é prova. O bom senso já o excluiu, e as regras do Código de Processo Criminal o exclua também.

Ficam os boatos da corja da Colina do Sol, e a palavra d'O Moleque que Mente®, a "palavra da vítima". Vamos na próxima examinar suas palavras, e também a decisão num caso semelhante pela Justiça do Rio de Janeiro, cuja confirmação pela TJ-RJ foi publicada faz uma semana.

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