domingo, 11 de abril de 2010

Noite de terror na Delegacia: Relatório para o Ouvidor Nacional

Eu falei com os filhos de Isaías Moreira em 15 de março de 2008, na minha primeira viagem para Taquara. Me recontaram das ameaças da polícia na delegacia, na tentativa de conseguir alguma depoimento de vítima que sustentava as acusações que delegado Juliano Brasil Ferreira tinha feito para a mídia do país inteiro, logo que prendeu os quatro no dia 11 de dezembro de 2007.

Silvo Levy e eu colocamos um resumo das suas palavras no relatório que preparamos para o Ouvidor Nacional de Diretos Humanos em março de 2008. Aqui, da página 12 do relatório:


Coação de depoentes

A família de Isaías Moreira foi chamada a depor na delegacia de Taquara. Foram ele e seus filhos Ezequiel (Bob), Oziel e [LAM]. Mantiveram-nos lá por sete horas, de 14:00 até 21:00, até que finalmente as crianças "confessaram" o que a polícia queria ouvir.

Segundo Oziel, a polícia não fez rodeios. "Um policial me levou num canto para dizer, Ajuda nós aqui para a gente ferrar este homem. Vamos dar um jeito de leve este cara de volta aos Estados Unidos e prender ele lá."

À proporção que as crianças insistiam que nada tinha havido, a polícia apertava o cerco.

"Estávamos apavorados. Houve chute, tapa, falaram que iam nos prender." O tratamento incluiu um coice na perna de um dos meninos, uma tapa que fez seu boné voar e foi ouvido até no corredor, murros na mesa, gritaria. Até o simples pedido de ir ao banheiro foi recebido com "Não, tu vais ao banheiro lá no presídio."

Mais tarde a família tentou retificar o depoimento. Foram primeiro ao fórum de Taquara. "Fomos lá falar com a juíza mas ela estava ocupada e não podia falar. No fórum, disseram para falar com a Corregedoria" [em Porto Alegre]. Lá perguntaram por que levou uma semana até irem. "Nós não tínhamos como ir para a Corregedoria aquele dia." Depois: “Nem a assessora queria falar conosco. Disseram que não adiantava nada reclamar, não faria diferença."

Mas fez diferença. Dias depois que Isaías e seus filhos contaram sua história na Corregedoria, Isaías foi indiciado por falsa denúncia contra a polícia!


A guerra dos versões

A polícia, é óbvia, nega que houve coerção dos jovens. Eu, que já fui espancado em delegacia (em tempo: não a de Taquara), tendo a não acreditar muito na versão da polícia. Ainda assim, vamos postar aqui mais tarde sua "versão".

A imprensa adora o "outro lado", e o teoria de que há duas versões para tudo. Formado nem em jornalismo nem direito, mas em filosofia e lógica, acredito que existe a verdade, acessível a quem se esforça para encontrar-la.

Nos já tratamos aqui do valor especial da palavra da vítima em casos de abuso sexual - e de tortura. Um dos quais explica as acusações assinados pelos filhos de Isaías Moreira, depois de 7 horas na delegacia.

Peço para o leitor, por um momento, deixa ao lado o ela-disse-ele-disse, e contemplas o caso sem paixões. Noto que:

  • Os filhos de Isaías Moreira, como as outras supostas vítimas, negaram abuso antes da sessão com os policias da DHPD, no caso do L.M. minutos antes dentro da delegacia perante o medico-legalista de Taquara dizendo que "nunca tocaram ou manipularam seu corpo";
  • Os filhos de Isaías negaram abuso no dia seguinte à entrevista de sete horas com a DHPD, procurando a Promotoria e a Corregedoria para tal fim;
  • As acusações partiram não das vítimas, mas dos devedores e desafetos dos acusados, que pararam de pagar na mesma semana que conseguiram a prisão do seu credor;
  • O papel que Isaías assinou, ninguém leu para ele. E ele não sabe ler e escrever;
  • Isaías e seus filhos foram mantidos sete horas dentro da delegacia.

Vamos considerar aquele último ponto. Sete horas. Entraram as 14:30, e saíram depois das 21:00. Imagina levar quase um dia inteiro de serviço, numa reunião. Ainda que você pudesse beber água ou ir ao banheiro, que me contaram que não foi lhes permitido. Sete horas.

Sete horas não são precisas para o que quatro pessoas querem dizer.

São precisas para o que a polícia quer ouvir.

Para saber que meios os policiais usaram para conseguir o que queriam ouvir, precisamos entrar nas versões. Mas pelos sete horas, já sabemos que algum meio foi utilizado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário