sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A palavra da vítima

Induvidoso que nos crimes sexuais, a palavra da vítima, quando em harmonia com os demais elementos de certeza dos autos, reveste-se de valor probante e autoriza a conclusão quanto à autoria e às circunstâncias do crime. Precedente (STF - 2ª Turma, HC 79.850-1, rel. Min. Maurício Corrêa).
Em crimes sexuais, praticados na clandestinidade, não há por que pôr em dúvida a palavra da vítima, se coerente e nada indicado que movida por propósito escuso, ainda mais quando contrariada apenas pelo relato do próprio acusado. (TJ-RS, 7ª Câmera Criminal, Nº 70020179594, rel. Des. Marcelo Bandeira Pereira.

De peso especial em acusações de crimes sexuais, a palavra da vítima é essencial no caso Colina do Sol.

Mas neste caso, a palavra da vítima é "não". Que não houve abuso, que nunca foram assediadas ou mal tratadas pelos acusados.

Desprezando a voz da vítima

No dia das prisões em Morro da Pedra, amplamente coberto pela imprensa, as "vitimas" foram levadas para o Departamento de Homicídios em Porto Alegre. E lá, disserem "não".

Disseram todos, "não". Mas a falsa psiquiatra Dra. Heloisa Fischer Meyer fez laudos dizendo que foram abusados, a Justiça aceitou isso como "indício".

A palavra da vítima vale, parece, somente quando acusa.

A família que sabe

No acordão citado acima, a vítima, ainda que maior, é portadora da síndrome de down. Desembargador Marcelo Bandeira Pereira observou que,

E a família da vítima, que bem a conhece, assim em condições de medir o grau de verossimilhança de seus dizeres, acreditou nos seus ditos ...

No caso das "vítimas" de Morro da Pedra, suas famílias souberam medir seu grau de verossimilhança. Acreditaram nos seus filhos, e - fora uma mãe que diz que foi enganada - não representaram contra os acusados.

Mas a Promotoria e a Justiça de Taquara não seguiram a sabedoria da sétima câmara. Denunciaram os pais (e, curiosamente, nunca as mães) por ser "coniventes".

Não vale a palavra da vítima, que seria a primeira a saber de abuso. Não vale avaliação da família, que conhece a vítima desde que nasceu.

A promotoria e a justiça e a psiquiatra fajuta sabem o que a vítima não sabe, e a conhece melhor que a própria família conhece. Seria onisciência? Ou prepotência?

In dúbio pro torturado

O promotor Nadilson Portilho Gomes argumenta que o "Ministério Público deve, sempre que possível, adotar o entendimento a favor da vítima de tortura", sugerindo analogia ao tratamento de vítima de violência sexual, argumentando que:

Semelhantemente aos crimes sexuais, os delitos de tortura ocorrem às escondidas, em lugares ermos, longe de testemunhas, onde os seus autores, na maior parte das vezes, valem-se das condições indefesas das vítimas para perpetrarem suas maldades.

Dr. Nadilson sugere um procedimento do Ministério Público nestes casos:

As investigações e as instruções criminais dos casos de tortura devem ter atenção especial por parte do MP, de forma a garantir-se a preservação das provas e a busca da verdade real dado o caráter único desses tipos de violências, a necessidade de suas prevenções e repressões rigorosas e situação singular de fragilidade da vítima.

A coação da família de Isaías Moreira

Em 10/12/2007, Isaías Moreira e três dos seus filhos foram mantido por sete horas dentro da Delegacia de Taquara, por policiais da Delegacia de Homicídios de Porto Alegre. Conforme declaração de Sr. Isaías na Ocorrência 1/2000 da Corregedoria:

Na DP Taquara, os menores sofrerem agressões dos policiais e foram obrigados a dizer que teriam mantido relações sexuais com FRITZ, o qual está sendo acusado de abusar sexualmente de crianças. Das agressões sofridas por seus filhos não resultaram lesões. Que o comunicante estava presente quando do interrogatório dos menores e tentou intervir quando das agressões e intimidações sofridos pelos mesmos, mas foi mandado calar a boca por um dos policiais.

Estava presente uma policial feminina, aparentemente a Inspetora Rosie C. Santos que assinou uma Certidão desmentido por Laudo do Instituto de Criminalística.

No dia seguinte às suas horas de terror na delegacia, os filhos de Sr. Isaías procuraram Cristiano Fedrigo, querendo retirar os depoimentos que fizeram sob coação. Cristiano os levou para o Ministério Publico em Taquara, para falar como a Dra. Natália Cagliari.


Dra. Natália se recusou a recebê-los.

Dr. Nadilson Portilho Gomes fez uma argumentação sensata comparando a vítima de tortura à vítima de violência sexual, justificando peso especial para suas palavras.

Dra. Natália segue uma outra metodologia, e nem dá ouvidos às vítimas.

Mais ainda, ela usou o fato de que Cristiano a procurou para denunciar o crime de tortura de menores, como justificativa para grampear o telefone dele.

Depois, Dra. Natália denunciou Isaías por ter reclamado da tortura na Corregedoria

Uma atitude que teria assegurada sua subida na carreira profissional, 40 anos atrás. Eu imaginava que vivemos em outros tempos, mas o Ministério Publico do Rio Grande do Sul continua na defesa da Dra. Natália no caso Colina do Sol.

Palavra precisa ser coerente

Uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo em 06/11/2008, notada no site Consultor Juridico, aponta que:

A tese que fundamentou a decisão foi a de que, em delitos contra os costumes, a palavra da vítima, apesar de relevante, precisa ser firme, coerente e harmônica. Não pode deixar dúvidas sobre a verdade.

Outros decisões são semelhantes: apesar da sua relevância especial, a palavra da vítima precisa ser coerente. E ainda que não tiver evidência que a sustenta - sendo que muitas vezes estas ofensas não tenham testemunhas e não deixam vestígios - igualmente não podem existir provas que desmentem a vítima.

...nos delitos contra os costumes, pela sua própria natureza, a palavra da vítima assume excepcional relevância, particularmente quando coerente e harmoniosa com os demais elementos dos autos. A versão da vítima para os fatos deve prevalecer sobre as negativas do acusado, salvo se provado de modo cabal e incontroverso que se equivocou ou mentiu. (TJMG. Apelação Criminal n. 1.0400.99.0000806-4/001. 2005) – (sem grifo no original), em O valor da palavra da vítima nos crimes de abuso sexual contra crianças nos julgados do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, de Mônica Jacinto

O Moleque que Mente®

Vamos detalhar numa matéria futura porque O Moleque que Mente® merece seu codinome. Por hoje, digo que ele afirmou que nadou na piscina do Fritz que não tem piscina, e que me viu antes das prisões em Taquara quando eu não tinha pisado em terras gaúchas em mais de 15 anos. E por aí vai.

A palavra de todas as "vitimas" de Morro da Pedra foi firme e coerente: não foram abusadas.

A promotora não acredita nelas.

A palavra d'O Moleque que Mente® e da outra testemunha do orfanato, uma moça com deficiência mental (que aqui chamaremos de "Cisne"), são inconsistentes uma com outra, e brigam com os registros em papel do orfanato e outros fatos objetivos.

Mas a promotora acredita na palavra delas.

A promotora não está dando "relevância especial" à palavra da vítima. Está dando "relevância especial" a quem acusa, e só. E não há nada na jurisprudência que sustente esta atitude.

"Depoimento sem dano"

No caso Colina do Sol, quase todos os menores deram seus depoimentos através do projeto "Depoimento sem Dano" no Fórum Central de Porto Alegre. Neste sistema, as crianças falam numa sala separada, as perguntas passadas com ponto eletrônico para um psicólogo, chamado de "Técnico Facilitador".

AO sistema tem suas vantagens. O depoimento é gravado, o qual seria útil para futuros estudantes deste caso. E protege as crianças, como pode ser visto no interrogatório do único menor ouvido na sala de audiência em Taquara. Este foi tratado com cortesia pelos advogados dos acusados, mas reduzido aos prantos pela promotora Dra. Natália Calgiari, ao ponto que o avô do menino ameaçou retirar-lo da sala.

O depoimento sem dano não protege de tudo, como foi o caso de um menor interrogado neste sistema. Seu depoimento talvez foi sem dano, mas Dra. Natália perguntou para seus parentes e vizinhos, na Sala de Juri do Fórum de Taquara, se não achavam o menor "gays".

Mas que sistema poderia proteger menores de uma promotora destas?

Apesar da isolação dos acusados na hora de depoimento, os menores precisavam entrar na sala de audiência para assinar o termo da audiência. Os de Morro da Pedra aproveitaram para dar abraços em Fritz e Barbara, os acusados.

Intermediários da verdade

A jornalista americana Dorothy Rabinowitz ganhou o prêmio Pulitzer com suas colunas, inclusive as juntadas no livro "No Crueler Tyrannies: Accusation, False Witness, and other terrors of our times", sobre casos específicos da onda de falsas acusações de "redes de pedofilia" nos Estados Unidos.

Uma das técnicas que Rabinowitz critica é o uso de testemunhas "expert" com o suposto dom de dizer quando uma criança acusadora está falando a verdade, e quando o acusado está mentindo. Umas destas "experts" iam de processo em processo pelo país, informando jurados que esta ou aquela criança exibia sintomas de abuso, e que a maneira em que seu acusador afirmava inocência - pelo vocabulário, peloa postura corporal - estava na verdade fazendo "admissão por negação". (Rabinowitz, pp. 215-218)

No sistema americano, Rabinowitz diz, é a função do júri determinar qual dos testemunhas está falando a verdade, e qual está mentindo. Introduzindo uma suposta testemunha "expert" para dizer que outra testemunha está mentindo ou não, usurpa esta função do júri.

Na Justiça brasileira, cabe ao Juiz de Direto determinar quais das testemunhas que aparecem na sua sala de audiência estão faltando com a verdade. E não é a menor das suas atribuições.

Perigo da "Técnica Facilitadora"

A promotora pediu, e a juíza permitiu, que a Técnica Facilitadora Vanea Maria Visnievski do projeto Depoimento sem Dano enviasse um relatório sobre os depoimentos dos menores.

Este relatório remete ao problema dos "experts" destacado por Rabinowitz. Para começar, é intitulado "Relatório Técnico" como se o dom de dizer se alguém esteja mentindo, fosse alguma técnica melhor dominada por Assistente Social Judiciária, do que por Juiz de Direto.

A Assistente Social adota atitudes diferentes para com os jovens de Morro da Pedra, e para com os dois menores institucionalizados. A estes últimos, O Moleque que Mente® e Cisne, Vanea dedica tanto espaço quanto aos nove menores de Morro da Pedra.

O relatório inclui entre seus "COMENTÁRIOS TÉCNICOS" de que:

"No conteúdo das vítimas que se encontram com seus pais ou responsáveis, fica evidente a vulnerabilidade social em que esses adolescentes se encontram, oriundos de famílias numerosas, em situação de pobreza. ..."

A Assistente Social dá os nomes dos jovens de Morro da Pedra e suas idades, mas com erros, e.g. Douglas é dado 18 anos quando na época tinha somente 17. Além disso, ela cita no relatório a defesa dos réus, sempre com trechos falando de presentes.

"Discurso Genuíno"

Falando de Cisne e O Moleque que Mente®, a Assistente Social usa as frases "relato genuíno" e "discurso genuíno". Mas visto objetivamente, comparando o que O Moleque que Mente® fala com as informações de outras fontes, e com o que Cisne fala, é claro que, "discurso genuíno" ou não, o moleque mente. E a Assistente Social não percebe, ou não dá muita bola para fatos objetivos como idades, datas e horários.

A procura de acusações

A Assistente Social despreza os jovens de Morro da Pedra. Enfatiza que são pobres e que receberam presentes sugerindo que eles se venderam. Prova maior do desprezo é que nem verifica suas idades, e que para ela, cada um merece um quinto do espaço daqueles que seguem o roteiro, e acusam.

Para a promotora, a palavra da vítima, dita durante sete horas de ameaças da polícia, vale; o que é dito no dia seguinte e nos meses que seguem, dentro e fora do Fórum, não. Para a Assistente Técnica, a palavra afirmando abuso é "genuína" ainda que recheada de contradições e contra-fatuais, mas a palavra de quem nega abuso precisa ser desvalorizada.

A palavra filtrada

No caso Colina do Sol, não é a palavra da vítima que é dado valor probante: é a palavra de acusação. Quando a palavra de um menor, dada sob coação, é de acusação, vale. Mas a palavra de renegação não vale, nem a palavra contra a polícia. Os jovens cujas famílias tem a coragem de enfrentar o poder do governo, mantendo sua palavra ainda sabendo que seriam denunciados por isso: bem, a palavra destes não vale, pobre se vende barato. Mas os institucionalizados, prestes a inventar algo contra uma visita quando seus tutores assim quiserem, cujos relatos são falsos em tudo que puder ser confirmado com dados objetivos: estes, sim, tem "discurso genuíno"!

A palavra da vítima não pode ser uma arma de uso exclusivo da acusação. Ou ele vale sempre, tanto para inocentar quanto para condenar, ou não passa de um truque a serviço de ideólogos que vejam abusadores atrás de cada árvore.

A Justiça não pode ceder aos Assistentes Sociais o papel de determinar se uma testemunha está faltando com a verdade. Nos crimes sexuais a palavra da vítima pode assumir um peso especial. Mas não poderia haver uma panelinha cujos salários e carreiras dependem do número de processos e condenações por crimes sexuais, filtrando a palavra da vítima conforme sua ideologia e sua conveniência, para que sempre pese no lado de condenação da balança.

Um comentário:

  1. Me assusta pensar como conseguiram juntar tanta gente mal intencionada para inventar todas essas acusações e, ainda por cima, direcionar o julgamento a favor da acusação mesmo com a grande falta de provas.

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