O Clube Naturista Colina do Sol some no horizonte, depois um longo crepúsculo.
Na calma da noite, aparecem as estrelas. E a esperança de um novo dia.
Para explicar o que quero dizer, preciso abordar os crimes cometidos por uma corja de malfeitores, que mais ou menos coincide com a diretoria do clube. Mas começo frisando que a diretoria não é o clube. Os estelionatários, os perjuros e seus capangas não são o naturismo. Há muitos sócios que não compactuam com os crimes da diretoria. Uns tem medo mas aguentam, outros simplesmente fizeram as malas e partiram.
Celso Rossi e a corja que fazia seu coro estão sendo postos para fora como conseqüência de calotes antigos, devido ao trabalho da grande Dra. Carmen Luzia Fagundes. E não fosse isso, mais cedo ou mais tarde, de qualquer forma o CNCS perderia todos seus bens para indenizar as vítimas das falsas denúncias com que compactuou. Antes e depois das prisões o CNCS foi cúmplice dos acusadores, vários dos quais faziam parte da diretoria. O estresse da perseguição implacável do CNCS foi a causa da morte de Nedy de Fátima Pinheiro Fedrigo - algo imperdoável, e irremediável.
Tudo que o CNCS possui ou possuía é pouco em comparação com o estrago por ele provocado, e teria sido perdido para compensar as vítimas ainda vivas. Mas este mês esta possibilidade foi bloqueada, pois as terras foram tomadas para indenização de outrem.
O rol dos inocentes
A questão agora é o que será feito delas. É uma questão ainda sem resposta.
Há muitos inocentes que sofreram nesta história. Claro que há as vítimas das falsas acusações. Mas há outros. Dos que trabalharam para restabelecer a verdade há Silvio Levy, que há quase cinco anos comprou os direitos do Celso Rossi na Colina e entregou parte deles ao próprio clube, na tentativa de libertá-lo da hegemonia estranguladora do fundador. Silvio gastou muito em prol do sonho que a Colina do Sol já foi. Em troca de sua benesse, perdeu seu investimento e ficou na mira da corja. Foi processado devido às representações dos dirigentes da Colina, eles próprios incentivados pela promotora Dra. Natalia Cagliari, conforme comprova o próprio processo. Fritz Louderback conta que no dia em que foi preso um dos policias alardeou que Silvio também ia ser preso pelos mesmos crimes, e o delegado Juliano Brasil Ferreira logo espalhou para a mídia que um “professor da Universidade de Berkeley” integrava a “rede internacional” de pedofilia que ele estava combatendo. O que só mostra como a “investigação” do ilustre delegado consistiu apenas em repetir as acusações que saíram de dentro da Colina, pois Silvio, apesar de matemático e de morar em Berkeley, nunca foi professor da universidade, como saberia qualquer um que o buscasse no google.
Há Cristiano Fedrigo, que perdeu sua mãe Nedy e dois anos de seus estudos. Sem contar que teve seu nome - aliás ótimo nome, pois tinha fama já conquistada - enlameado, sofrendo a indignidade de ser exposto de cueca em rede nacional de TV como “vítima menor de abuso sexual”. (Tinha na verdade 20 anos e nunca sofreu abuso nenhum.)
São estas algumas das pessoas que conheci nesta aventura, e minha vida se enriqueceu em tê-los conhecido. Só lamento que meu convívio com Nedy tenham sido tão curto.
Há outros inocentes que sofreram, embora não fossem alvejados diretamente. Nesta hora, é bom lembrar deles.
Há o BRDE, o banco público que emprestou o dinheiro do contribuinte para o hotel inacabado. Há o americano Dana Wayne Harbour, que perdeu as economias de uma vida inteira e afinal a própria vida dentro da Colina. Seu assassinato ainda não foi esclarecido. Talvez quando o “diretor de disciplina” do CNCS não estiver mais presente, aqueles que têm pistas sobre o crime perderão o medo e dirão o que sabem.
Há também os sócios, os residentes e donos de casas na Colina que, com o CNCS varrido de Morro da Pedra, perderam seu dinheiro.
E há Taquara.
A cidade de Taquara tinha a Colina do Sol como referência nacional. A comunidade naturista durante anos deu um retorno publicitário, mas nunca com o devido destaque para a cidade, e nunca deu o devido retorno comercial nem financeiro ao município que a acolheu e até se orgulhava dela.
O CNCS sempre desprezou Morro da Pedra, até proibindo que os residentes locais se associassem. Mas o desprezo e o desrespeito para com o município são também claros.
Já mostramos como Celso Rossi expressou essa atitude soberba na sua última manifestação no processo trabalhista, logo antes de seu advogado formalmente renunciar a causa e o cliente:
O Centro Naturista Colina do Sol ... nesta cidade com mais de cem habitações ... é uma pequena cidade ... propriedade do CNCS - Clube Naturista Colina do Sol, entidade com autonomia política ...
Ainda há poucos meses, os guardas da Colina barraram na porteira - erguida em estrada pública! - os funcionários da prefeitura que foram fiscalizar o hotel, cuja abertura tinha sido noticiada na Internet. O hotel não somente carece de alvará, mas semana retrasada me informaram na Prefeitura que segundo os registros da cidade tudo lá esta “sob construção”. Nada está regularizado, nada tem habite-se.
A Colina age realmente como se tivesse “autonomia política”. O que surpreende é que por tantos anos ficou impune.
Esse empreendimento poderia, e deveria, trazer turistas, comércio, impostos, renda e fama a Taquara, da mesma maneira que poderia e deveria trazer emprego e vantagens à vizinhança imediata de Morro da Pedra.
O peso da responsabilidade
Fritz Louderback, chegado em Morro da Pedra com boa situação econômica, ajudou seus vizinhos. Muitos da Colina acharam logo que ali estava apenas um otário a ser explorado. Quando ele passou a ajudar as famílias mais humildes da vizinhança, a corja ficou ressentida, e depois conspirou para se apoderar dos seus bens com as falsas acusações de pedofilia, livrando-se também de pagar o dinheiro que pediram emprestado dele.
A promotora Dra. Natalia Cagliari achou que a generosidade do Fritz só poderiam ser em troca de algo vil, e que os habitantes de Morro da Pedra, não tendo dinheiro, também não podiam ter honra.
Mas Fritz estava agindo conforme o código cristão de moralidade universal: faça aos outros como quer lhe façam. Quem tem recursos tem obrigações. Fritz Louderback, vendo as crianças de Morro da Pedra desperdiçarem seu futuro, quando uma pequena quantia bem aplicada poderia abrir-lhes um leque de oportunidades, resolveu agir. Silvio Levy investiu pesado para colocar a Colina em condições de ajudar Fritz em sua ação social. Cristiano Fedrigo desde muito jovem agiu a favor dos ainda mais pobres. Eu, vendo de longe uma caça às bruxas, e sabendo que ninguém estaria mais bem preparado do que eu para agir, fiz o que pude, ainda que no começo não conhecesse ninguém da Colina, nem de Taquara, nem de Morro da Pedra.
O grande pioneiro da luta contra o racismo nos EUA, o reverendo Martin Luther King, disse uma vez que a maior tragédia não é “o clamor estridente dos maus, mas o espantoso silêncio dos bons”. O clamor dos maus não faltou neste caso: a violência do “diretor de disciplina” da Colina, com suas armas de fogo ilegais; a corrupção e a desonestidade dos diregentes do CNCS; os policiais que forjaram provas e seviciaram menores para obter falsos depoimentos; os repórteres preguiçosos e sem ética que divulgaram as mentiras mais extravagantes e nunca se preocuparam em questionar os absurdos, cotejar com os fatos nem ouvir o outro lado. E talvez pior de tudo a promotora Dra. Natália Cagliari, cuja atitude no começo talvez pudesse ser excesso de zelo ou trágica falta de critério, mas atualmente só se explica como algo muito mais sinistro que mera incompetência -- como aliás o indica sua amizade pessoal e seu contato com os acusadores, num claro conflito de interesse.
O silêncio dos bons também foi espantoso, mas houve exceções, como Cristiano e os pais das crianças, que preferiram ser denunciados pelo Ministério Público do que prestar falso testemunho. A esses poucos bons, que começaram apenas com a cara e a coragem, gradualmente juntamo-nos muitos outros a quebrar o silêncio: em Morro da Pedra, em Taquara, em Porto Alegre, em São Paulo, em Brasília, na Califórnia, e ainda mais longe. A batalha não está ganha, mas a maré sem dúvida virou e continuaremos enfrentando o clamor estridente dos maus com a fala da verdade e o amor pela justiça.
O sol também nasce
Há tempo de tempo de derrubar, e tempo de edificar; tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de rasgar, e tempo de coser. A responsabilidade exige que estejamos presentes também na hora de edificar, de costurar, de plantar.
A Colina do Sol nunca foi gerida como um negócio viável. Era uma negociata, uma maneira de iludir “investidores” que entregavam seu dinheiro ao Celso Rossi em troca de um belo título, elegantemente impresso em papel beige, cujo valor só faz declinar há anos e anos. A venda de “concessões” também servia para encaminhar ao fundador do CNCS quantia às vezes muito maior que o concessionário jamais conseguiria angariar. Era um modelo em que a hora da safra sempre vinha antes da hora de plantar. Não poderia dar certo, e não deu.
Seria viável haver outra vez uma comunidade naturista no local onde houve o Clube Naturista Colina do Sol? Plantando, e aguardando, haverá safra?
Há dificuldades, e não são poucas. A reputação da Colina, que há sete ou oito anos era o que ela tinha de mais valioso, já vinha decaindo há tempos, ainda antes que o assassinato do Wayne e as acusações de pedofilia a arrasassem de vez. Metade das casas são inabitáveis e até irreparáveis; o lago está cheio de lama; o valor econômico do hotel talvez nem justifique o custo de acabar de construi-lo (e já consumiu tanto dinheiro!); e mesmo se todos estes problemas se resolverem, o clima local é menos propício ao naturismo que o de muitas outras áreas do Brasil.
Mas há muitos fatores positivos também. Para começar mencionemos o povo de Morro da Pedra, que não se dobrou às ameaças da polícia nem da promotora, e que está em harmonia com aqueles que querem construir nas cinzas da Colina aquilo que a Colina se declarava ser.
Mencionemos igualmente Taquara, que acolheu e apoiou o naturismo de braços abertos, às vezes como um hábito excêntrico mas nunca com hostilidade. Taquara me impressionou e até me encantou em minhas muitas visitas nesse ano e meio. Mencionemos o bom nível de educação, as oportunidades de turismo, a proximidade de Porto Alegre, e a parte da infra-estrutura da Colina que pode ser salva do cupim e do mofo.
Estamos estudando como salvar aquilo que era a Colina. Financeiramente, já ficou claro que seria mais viável montar algo igual no nordeste, mais próximo da Europa e da América do Norte, e atraente aos brasileiros doze meses do ano.
Ainda assim, estamos tentando achar o caminho, fazer um plano, levantar o dinheiro para executá-lo. Não será fácil, mas também não foi fácil enfrentar os abusos das autoridades e o ódio da gangue da Colina. Agora que explodiu a bomba, ainda que não tenha sido plantada por nós, não queremos só deixar as ruínas para o bom povo de Morro da Pedra limpar. Queremos reconstruir juntos.
O Sol da Colina se pôs num mar de tinta vermelha. Com certeza, não será possível compensar todos que “investiram” na Colina do Sol. E nem é esse nosso dever. Arriscamos nossos bens, nosso bons nomes (Silvio e eu fomos denunciados e a promotora tentou achar algo para denunciar Cristiano), e até nossas vidas (lembrem-se do sina do Wayne e da Nedy). Não queremos criticar aqueles que ficaram só assistindo, mas também não temos a obrigação de salvar-los da sua perda meramente financeira. Quem deve compensá-los é Celso Rossi e a diretoria do CNCS.
O passado não podemos consertar. Mas criar um novo futuro talvez seja possível. Acordar do pesadelo para um novo dia, fazer brotar naquele pedaço de terra uma realidade mais próxima do antigo sonho, algo que traria para Morro da Pedra e Taquara os benefícios sempre prometidos, e para os naturistas, a terra prometida. Havendo um caminho, encontraremos. Havendo dinheiro, seguiremos.